"...é concebível que acabemos descobrindo mais e não menos mulheres autistas, assim que examinarmos melhor; talvez a célebre vantagem feminina na linguagem e inteligência social proteja algumas mulheres, nascidas com a herança genética do autismo, excluindo-as da categoria diagnosticável de "autismo de alto funcionamento" e incluindo-as na forma disfarçada e não manifesta do distúrbio.(...)" (John J. Ratey e Catherine Johnson, no livro "Síndromes Silenciosas", p.235 Ed. Objetiva)
"A alma dos diferentes é feita de uma luz além. Sua estrela tem moradas deslumbrantes que eles guardam para os poucos capazes de os sentir e entender. Nessas moradas estão tesouros da ternura humana dos quais só os diferentes são capazes. Não mexa com o amor de um diferente. A menos que você seja suficientemente forte para suportá-lo depois". (Arthur da Távola)

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segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Como adquirir o "verniz social"?

Olá!



Após publicar as novidades das férias que foram muito boas, eu me peguei tendo a sensação de fracasso e me incomodei, afinal a vinda do meu filho para casa foi uma das maiores realizações da minha vida.


Pois bem, como eu já relatei nestas publicações: "Empatia: Uma preciosa ferramenta" e "O modo correto nosso, maneira inadequada para muitos!" , eu sofro muito com minha inadequação social e apesar de saber que este é o transtorno do qual eu sou portadora é difícil conviver com as conseqüências deste meu comportamento .

Citarei mais uma vez o meu livro de cabeceira, meu manual de instruções, o livro da Ed. Objetiva “Síndromes Silenciosas” de John J. Ratey e Catherine Johnson “Como reconhecer as disfunções psicológicas que alteram o curso de nossas vidas.”

Pois é, ALTERAM o curso de nossas vidas...

“... A capacidade do genoma, a constituição genética total de um indivíduo, de produzir crianças cognitivamente retardadas mas socialmente capazes, ou cognitivamente brilhantes (como alguns sábios autistas) mas socialmente deficientes, mostra que a inteligência social é uma inteligência isolada que depende, em grau significativo, da estrutura e química cerebrais.”

“...No autismo , alguns estágios infantis esperados ( acenar “olá” e “até logo”, compartilhar a atenção e brincar de faz-de-conta, entre outros) não ocorrem no tempo certo ou deixam de ocorrer. Por isso a idéia de formas atenuadas, ocultas, de autismo parece a princípio simplesmente impossível, da mesma maneira que parece impossível a noção de um caso de retardo mental “oculto”: em todos os níveis, o retardo mental é um déficit demasiado óbvio para passar despercebido pelo que é. Mas, de fato, muitos casos brandos de autismo ocorrem, embora os pesquisadores só tenham descoberto isso nos últimos 10 anos. ”

Esta deficiência social realmente altera o curso da minha vida, pois mais uma vez eu fracassei na tentativa de ter amigos, fiz tudo como eu achava ser o modo correto e com isto consegui acabar com uma amizade que para mim era importante e valorosa, claro que todos devem pensar que se fosse realmente uma amizade não acabaria assim, mas é que eu também não sei dizer se era recíproco, pois não sei avaliar nem isso.

Posso dizer para vocês que a minha realização individual, minha auto estima, meu respeito próprio fica por assim dizer aniquilado, e fica difícil ser mulher, mãe e amiga nessas horas, a solidão me consome e o isolamento volta e com isso minha capacidade criativa vai embora, meu ânimo some minha alma foge de mim mesma e me sinto literalmente um robô, um zumbi.

Busco no amor pelos meus filhos o meu eu verdadeiro de volta!

As vezes me inspiro em alguns livros e filmes, o que me lembro agora é do filme “Lucy in the Sky”, sobre pais e filhos...

Bem, se alguém souber onde se adquire o tão sonhado “verniz social” para portadores do traço autístico me informe por favor!!

Bom, me sinto na obrigação de dividir com vocês o fato de eu me sentir muito mais capaz de conviver com tudo isto depois de medicada com a “risperidona” e a “sertralina”, e com o acompanhamento da médica psiquiatra e da psicoterapeuta. Quando eu tratava só com o antidepressivo o resultado era insatisfatório mas com o uso concomitante da risperidona eu estou satisfeita, com esta medicação acabou a confusão mental e a fragilidade perante as situações difíceis melhoraram muito.

Por enquanto a medicação é o meu verniz...pois me afasta de repetir as falas e os gestos, pelo menos não sofro várias vezes com o mesmo erro, e consigo avaliar melhor as novas e adversas situações.

Agradeço a todos pelos comentários, esta troca é que me faz continuar!!

Abraço fraterno a todos!

Grace Caroline.
tidymae@hotmail.com

sábado, 29 de janeiro de 2011

Novidades!


Olá!

Voltando das férias escolares dos meus filhos, sim porque as férias são para eles, não é mesmo? Os pais "se viram nos trinta" para conviver com tanto tempo livre e ocioso!!

Mas, como ser mãe é padecer no paraíso, eu preciso contar a novidade:

O meu Frederico está morando conosco!!!!!!!!!!!Sim ele está comigo, e a minha felicidade é infinita e tem gosto de vitória, mais um sonho realizado e em paz!

E como felicidade nunca é demais, adotamos mais uma integrante para a família, a gata-garota Lucy Liu, nossa estimada gatinha:


Ela não é um espetáculo?

Aqui em casa somos todos gateiros de fato, e como eu já havia dito na publicação COMPORTAMENTO FELINO  no blog da minha filha Anna a semelhança é grande entre os autistas e os felinos, então a nossa convivência é maravilhosa, e a presença da Lucy é muito prazerosa.

Estas são as novidades do verão.

Até breve!

Abração da Grace!




quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Tradução de mim mesma...

"Clarice Lispector muitas vezes me traduz:

"Sou sempre eu mesma, mas com certeza não serei a mesma pra sempre."



"Inútil querer me classificar,eu simplesmente escapulo não deixando. Gênero não me pega mais."

"Acordei hoje com tal nostalgia de ser feliz. Eu nunca fui livre na minha vida inteira. Por dentro eu sempre me persegui. Eu me tornei intolerável para mim mesma. Vivo numa dualidade dilacerante. Eu tenho uma aparente liberdade mas estou presa dentro de mim."

"Às vezes me dá enjôo de gente. Depois passa e fico de novo toda curiosa e atenta. E é só."

"Você só terá sucesso na vida
quando perdoar os erros
e as decepções do passado."

"Passei a vida tentando corrigir os erros que cometi na minha ânsia de acertar."

"Mas tenho medo do que é novo e tenho medo de viver o que não entendo - quero sempre ter a garantia de pelo menos estar pensando que entendo, não sei me entregar à desorientação."

"Olhe, tenho uma alma muito prolixa e uso poucas palavras.
Sou irritável e firo facilmente.
Também sou muito calmo e perdôo logo.
Não esqueço nunca.
Mas há poucas coisas de que eu me lembre."

"Porque eu fazia do amor um cálculo matemático errado: pensava que, somando as compreensões, eu amava. Não sabia que, somando as incompreensões é que se ama verdadeiramente. Porque eu, só por ter tido carinho, pensei que amar é fácil."

"E se me achar esquisita,
respeite também.
até eu fui obrigada a me respeitar."


"Suponho que me entender não é uma questão de inteligência e sim de sentir, de entrar em contato...
Ou toca, ou não toca."

"É curioso como não sei dizer quem sou. Quer dizer, sei-o bem, mas não posso dizer. Sobretudo tenho medo de dizer porque no momento em que tento falar não só não exprimo o que sinto como o que sinto se transforma lentamente no que eu digo."

"Sou como você me vê.
Posso ser leve como uma brisa ou forte como uma ventania,
Depende de quando e como você me vê passar."

"Minha força está na solidão. Não tenho medo nem de chuvas tempestivas nem de grandes ventanias soltas, pois eu também sou o escuro da noite."

"Mas quero ter a liberdade de dizer coisas sem nexo como profunda forma de te atingir. Só o errado me atrai, e amo o pecado, a flor do pecado"

"Renda-se, como eu me rendi. Mergulhe no que você não conhece como eu mergulhei. Não se preocupe em entender, viver ultrapassa qualquer entendimento."

"...Que minha solidão me sirva de companhia.
que eu tenha a coragem de me enfrentar.
que eu saiba ficar com o nada
e mesmo assim me sentir
como se estivesse plena de tudo."

"Com todo perdão da palavra, eu sou um mistério para mim."

"Eu não sou tão triste assim, é que hoje eu estou cansada..."

"Eu não sou promíscua. Mas sou caleidoscópica: fascinam-me as minhas mutações faiscantes que aqui caleidoscopicamente registro."

"Gosto do modo carinhoso do inacabado, do malfeito, daquilo que desajeitadamente tenta um pequeno vôo e cai sem graça no chão."

"Não sei se quero descansar,por estar realmente cansada ou se quero descansar para desistir..."

"Perder-se também é caminho."

"Terei toda a aparência de quem falhou, e só eu saberei se foi a falha necessária."

"Sou uma filha da natureza:
quero pegar, sentir, tocar, ser.
E tudo isso já faz parte de um todo,
de um mistério.
Sou uma só... Sou um ser.
E deixo que você seja. Isso lhe assusta?
Creio que sim. Mas vale a pena.
Mesmo que doa. Dói só no começo."

"Vocação é diferente de talento. Pode-se ter vocação e não ter talento, isto é, pode-se ser chamado e não saber como ir."

"Faça com que eu saiba ficar com o nada e mesmo assim me sentir como se estivesse pleno de tudo..."

"Como se ela não tivesse suportado sentir o que sentira, desviou subitamente o rosto e olhou uma árvore. Seu coração não bateu no peito, o coração batia oco entre o estômago e os intestinos."

"O que eu sinto eu não ajo.
O que ajo não penso.
O que penso não sinto.
Do que sei sou ignorante.
Do que sinto não ignoro.
Não me entendo e ajo como se entendesse."


"Não é que vivo em eterna mutação, com novas adaptações a meu renovado viver e nunca chego ao fim de cada um dos modos de existir. Vivo de esboços não acabados e vacilantes. Mas equilibro-me como posso, entre mim e eu, entre mim e os homens, entre mim e o Deus."

"Minhas desequilibradas palavras são o luxo do meu silêncio."

"Ouve-me, ouve o meu silêncio. O que falo nunca é o que falo e sim outra coisa. Capta essa outra coisa de que na verdade falo porque eu mesma não posso."

"A felicidade aparece para aqueles que choram.
Para aqueles que se machucam.
Para aqueles que buscam e tentam sempre."

"Por te falar eu te assustarei e te perderei? Mas se eu não falar eu me perderei, e por me perder eu te perderia..."

"...Respeite mesmo o que é ruim em você - respeite sobretudo o que imagina que é ruim em você - não copie uma pessoa ideal, copie você mesma - é esse seu único meio de viver."

"Sou um monte intransponível no meu próprio caminho. Mas às vezes por uma palavra tua ou por uma palavra lida, de repente tudo se esclarece."


"Pegue para você o que lhe pertence, e o que lhe pertence é tudo o que sua vida exige. Parece uma vida amoral. Mas o que é verdadeiramente imoral é ter desistido de si mesma."

"Agora preciso de tua mão,
não para que eu não tenha medo,
mas para que tu não tenhas medo.
Sei que acreditar em tudo isso será,
no começo, a tua grande solidão.
Mas chegará o instante em que me darás a mão,
não mais por solidão, mas como eu agora:
Por amor."

"Todos os dias, quando acordo, vou correndo tirar a poeira da palavra amor..."

"Ando de um lado para outro, dentro de mim.
Estou bastante acostumada a estar só, mesmo junto dos outros."

"Estou com saudade de mim. Ando pouco recolhida, atendendo demais ao telefone, escrevo depressa, vivo depressa. Onde está eu?
Preciso fazer um retiro espiritual e encontrar-me enfim -enfim, mas que medo - de mim mesma."

"O que importa afinal, viver ou saber que se está vivendo?"

"Cuide-se como se você fosse de ouro, ponha-se você mesmo de vez em quando numa redoma e poupe-se."


"Faça com que eu tenha a coragem de me enfrentar.
Faça com que eu saiba ficar com o nada e mesmo assim me sentir como se estivesse plena de tudo.
Receba em teus braços o meu pecado de pensar.”

"Mas o vazio tem o valor e a semelhança do pleno. Um meio de obter é não procurar, um meio de ter é o de não pedir e somente acreditar que o silêncio que eu creio em mim é a resposta a meu - a meu mistério."

"Fico às vezes reduzida ao essencial, quer dizer, só meu coração bate."


"À duração da minha existência dou uma significação oculta que me ultrapassa. Sou um ser concomitante: reúno em mim o tempo passado, o presente e o futuro, o tempo que lateja no tique-taque dos relógios."

"Senti que podia. Fora feita para libertar. Libertar era uma palavra imensa, cheia de mistérios e dores."

"Mas tenho medo do que é novo e tenho medo de viver o que não entendo - quero sempre ter a garantia de pelo menos estar pensando que entendo, não sei me entregar à desorientação."

"Sabe o que quero de verdade!? Jamais perder a sensibilidade. Mesmo que às vezes ela arranhe um pouco a alma. Porque sem ela eu não poderia sentir a mim mesma."

Estas palavras de Clarice L. falam muito de mim...

Abraço a todos e até breve!

Grace Caroline

Autismo de alto funcionamento:

"Eu gostaria de acentuar que chamar este transtorno de autismo de alto funcionamento, é inadequado porque o termo sugere que o autismo é de alto funcionamento, que o autismo é leve, quando na verdade o que você está querendo é denominar uma pessoa de alto funcionamento com autismo.

Então, essa pessoa pode ter um bom QI ou uma boa compreensão verbal ou uma boa expressão verbal, mas seu autismo é normalmente tão grave quanto o de uma pessoa descrita com autismo de baixo funcionamento.

Então, por favor: usem alto funcionamento para a pessoa, não para o autismo, de maneira a permitir uma compreensão mais profunda de quão grave o autismo pode ser, mesmo para alguém com Síndrome de Asperger..."

(Dr. Christopher Gillberg, em out/2005 no auditório do InCor em SP)

Dr. Simon Baron-Cohen, diz no seu livro "Diferença essencial: a verdade sobre o cérebro de homens e mulheres.":

"...Dirijo uma clínica em Cambridge para adultos com suspeita de serem portadores da síndome de Asperger. Esses indivíduos não tiveram os problemas detectados na família nem na escola enquanto ainda eram crianças.

Assim, atravessaram a infância e a adolescência aos trancos e barrancos, e chegaram à idade adulta acumulando dificuldades, até serem encaminhados à nossa clínica, desesperados pela falta de integração, por se sentirem diferentes.

Na maioria dos casos, esses paciente sofrem também de depressão clínica, já que não encontram um ambiente, em termos de trabalho e de companheiro(a), que os aceite em sua diferença. Querem ser eles mesmos, mas são forçados a "vestir" um personagem, tentando desesperadamente não ofender, dizendo ou fazendo a coisa errada, e ainda assim, sem saber quando vão receber uma reação negativa ou ser considerados" seres estranhos".

Muitos deles se esforçam em administrar um enorme conjunto de regras relativas ao comportamento em cada situação, e consultam de minuto a minuto uma espécie de tabela mental, buscando o que dizer e o que fazer. É como se tentassem escrever um manual de interação social baseado em regras de causa e efeito, ou como se quisessem sistematizar o comportamento social, quando a abordagem natural à socialização deve ser através da empatia.

Imaginem um livro bem grosso de etiqueta sobre como agir em jantares,...mas escrito em detalhes, para cobrir todas as eventualidades do discurso social.

Claro que é impossível aprender tudo, e embora alguns desses indivíduos brilhantemente quase consigam, acabam fisicamente exaustos. Quando chegam em casa depois do trabalho, onde fingiram interagir normalmente com os colegas, a última coisa que querem é socializar. Só pensam em fechar a porta do mundo e dizer as palavras ou praticar as ações que tiveram de reprimir o dia todo.

Gostariam que os outros dissessem o que pensam e que eles pudessem fazer o mesmo; não entendem porque não podem.

É difícil para eles compreender como uma palavra sincera pode ofender ou causar problemas sociais."...

POEMA EM LINHA RETA

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.


Fernando Pessoa
(Álvaro de Campos)


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