"...é concebível que acabemos descobrindo mais e não menos mulheres autistas, assim que examinarmos melhor; talvez a célebre vantagem feminina na linguagem e inteligência social proteja algumas mulheres, nascidas com a herança genética do autismo, excluindo-as da categoria diagnosticável de "autismo de alto funcionamento" e incluindo-as na forma disfarçada e não manifesta do distúrbio.(...)" (John J. Ratey e Catherine Johnson, no livro "Síndromes Silenciosas", p.235 Ed. Objetiva)
"A alma dos diferentes é feita de uma luz além. Sua estrela tem moradas deslumbrantes que eles guardam para os poucos capazes de os sentir e entender. Nessas moradas estão tesouros da ternura humana dos quais só os diferentes são capazes. Não mexa com o amor de um diferente. A menos que você seja suficientemente forte para suportá-lo depois". (Arthur da Távola)

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terça-feira, 20 de abril de 2010

A minha rotina

A minha rotina é rígida.

A necessidade de organizar é muito grande.

Porém hoje numa reflexão mais profunda, eu percebi que muitas coisas na minha rotina é uma "bagunça", e eu me questionei o porque desta bagunça.

Eu me lembrei que sempre tive que seguir a rotina alheia, eu nunca tive a chance de ter a minha rotina.

Hoje eu tenho a minha casa e não consigo estabelecer uma rotina para as atividades domésticas e coletivas da família.

A minha rotina pessoal existe e é bem definida, mas porque a dificuldade com os outros setores?

Esta reflexão me permitiu entender que como eu nunca fui estimulada e seguir a minha maneira de fazer as coisas, pelo contrário, sempre fui incentivada a reaprender, a deixar de se quem eu sou, talvez por ser uma maneira muito diferente e incomodativa de ser, considerada muitas vezes como um jeito errado de fazer as coisas, então eu não faço certas tarefas pois realmente não consigo realizá-las, pois como eu sempre segui moldes alheios, eu acabei não definindo o meu jeito.

Resumindo: eu não sei como eu mesma faria certas coisas.

Muitas vezes tenho trabalho em dobro, pois acabo fazendo da forma mais difícil. Muitas vezes escuto: Nossa Grace! Como você complica as coisas!

Ou então quando eu tento dizer que daquela forma eu não consigo, e que eu sei que para mim aquilo não deve ser daquela forma, sou considerada pessimista e negativa.

Não é que eu vejo o lado negativo de certas coisas, é que para mim daquele jeito não funciona.

Eu sei que é um assunto tão banal, mas cada vez que eu tenho que fazer uma tarefa eu passo muitas horas tentando achar a maneira daquilo funcionar, as vezes dias, e tem coisas que eu estou a meses achando um jeito de organizar.

Eu já mudei de endereço mais de 50 vezes, morei em quatro estados e sete cidade diferentes, e cada mudança o caos se instala na minha vida como na vida de qualquer ser humano, porém eu fico muito tempo até conseguir organizar as coisas, as vezes quando eu tenho uma nova mudança para fazer a outra ainda não foi concluída.

Hoje eu tive certeza de que não sei o meu jeito de fazer certas coisas, e que algumas coisas eu não sei se conseguirei tentar aprender novamente, tamanho é o pavor que eu sinto só de pensar nisso.

Tenho plena consciência de que perco com isto, mas acho que nem quero ganhar mais nada, afinal eu nem sei o que fazer quando isto acontece.

Até a próxima e fiquem com Deus!

tidymae@hotmail.com

3 comentários:

  1. Cuidado, acho que estas cobrando muito de vc. Nâo é fácil cuidadr de tudo,ser mãe, dona de casa,a mulher etc, etc.
    Eu aqui tbém não tenho tudo em ordem não, e me encomoda tbém, mas não da pra dar conta de tudo. Somos humanos não máquinas!
    beijokas!

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  2. Olá Mãe do Autista,
    Concordo com vc, realmente eu me cobro muito.
    E as vezes me sinto meio máquina mesmo, meio sem "jogo de cintura".
    Dividir minhas experiências me faz ter contato com outras realidades e isto é bom para eu abrir minha visão do mundo.
    Beijokas para vc também!!

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  3. Nossa Grace. Li e reli o que você escreveu. É tão real que me acertou em cheio. Depois de um dia inteiro de palestras no EBPA seu depoimento me ajuda a processar o que ouvi.
    Tudo que você escreve é maravilhoso. Por favor, a cobrança tem que ser menor para que você possa olhar a si mesma por completo. Você é sua complitude. Não existe nada fora. Está tudo dentro de ti.

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Autismo de alto funcionamento:

"Eu gostaria de acentuar que chamar este transtorno de autismo de alto funcionamento, é inadequado porque o termo sugere que o autismo é de alto funcionamento, que o autismo é leve, quando na verdade o que você está querendo é denominar uma pessoa de alto funcionamento com autismo.

Então, essa pessoa pode ter um bom QI ou uma boa compreensão verbal ou uma boa expressão verbal, mas seu autismo é normalmente tão grave quanto o de uma pessoa descrita com autismo de baixo funcionamento.

Então, por favor: usem alto funcionamento para a pessoa, não para o autismo, de maneira a permitir uma compreensão mais profunda de quão grave o autismo pode ser, mesmo para alguém com Síndrome de Asperger..."

(Dr. Christopher Gillberg, em out/2005 no auditório do InCor em SP)

Dr. Simon Baron-Cohen, diz no seu livro "Diferença essencial: a verdade sobre o cérebro de homens e mulheres.":

"...Dirijo uma clínica em Cambridge para adultos com suspeita de serem portadores da síndome de Asperger. Esses indivíduos não tiveram os problemas detectados na família nem na escola enquanto ainda eram crianças.

Assim, atravessaram a infância e a adolescência aos trancos e barrancos, e chegaram à idade adulta acumulando dificuldades, até serem encaminhados à nossa clínica, desesperados pela falta de integração, por se sentirem diferentes.

Na maioria dos casos, esses paciente sofrem também de depressão clínica, já que não encontram um ambiente, em termos de trabalho e de companheiro(a), que os aceite em sua diferença. Querem ser eles mesmos, mas são forçados a "vestir" um personagem, tentando desesperadamente não ofender, dizendo ou fazendo a coisa errada, e ainda assim, sem saber quando vão receber uma reação negativa ou ser considerados" seres estranhos".

Muitos deles se esforçam em administrar um enorme conjunto de regras relativas ao comportamento em cada situação, e consultam de minuto a minuto uma espécie de tabela mental, buscando o que dizer e o que fazer. É como se tentassem escrever um manual de interação social baseado em regras de causa e efeito, ou como se quisessem sistematizar o comportamento social, quando a abordagem natural à socialização deve ser através da empatia.

Imaginem um livro bem grosso de etiqueta sobre como agir em jantares,...mas escrito em detalhes, para cobrir todas as eventualidades do discurso social.

Claro que é impossível aprender tudo, e embora alguns desses indivíduos brilhantemente quase consigam, acabam fisicamente exaustos. Quando chegam em casa depois do trabalho, onde fingiram interagir normalmente com os colegas, a última coisa que querem é socializar. Só pensam em fechar a porta do mundo e dizer as palavras ou praticar as ações que tiveram de reprimir o dia todo.

Gostariam que os outros dissessem o que pensam e que eles pudessem fazer o mesmo; não entendem porque não podem.

É difícil para eles compreender como uma palavra sincera pode ofender ou causar problemas sociais."...

POEMA EM LINHA RETA

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.


Fernando Pessoa
(Álvaro de Campos)


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